- E como eram os elementos que subtraíram seu veículo?
- Silvio, no caso.
- Como, indivíduo?
- Meu carro, que subtraíram, chamava Silvio. Podemos respeitar um ente querido que, neste momento, já deve estar definhando em um ferro-velho?
- Não, não podemos. Isso é uma delegacia. Temos mais 43 B.O.s para fazer ainda nesta madrugada. Como eram os elementos que subtraíram o veículo?
- Eram morenos.
- Pardos, você quer dizer?
- Não, morenos mesmo. Se eu quisesse dizer pardos, eu teria dito pardos. Como acho que eram morenos, disse morenos.
- Olha, ou eles eram brancos, negros ou pardos. Escolha um.
- Se eu disser moreninhos cor-de-disco, o senhor aceita?
- Vou colocar "pardos". Próximo passo. O que havia no interior veículo, que foi subtraído?
- Duas garrafas de cachaça. Duas escovas de dentes. 3 cadeados e um rolo de papel higiênico. Subtraíram tudo, sem dó.
- Como você carrega coisas estranhas no veículo.
- Eu tinha acabado de sair do Extra. Vou sentir bastante falta das cachaças. Era para fazer parte de um despacho, que seria feito amanhã. Agora, vou ter que comprar mais Pitú.
- Correto. Agora, descreva o delito.
- Bom, eu ia colocar as cachaças em uma esquina, dentro de um chapéu coco e... hey, alto lá. Isso aqui é um país livre e posso ter qualquer crença religiosa. Não se trata de delito. E eu não ia sacrificar uma cabra ou coisa assim.
- O delito, no caso, é a subtração do veículo.
- Ah. Bom, eu estava saindo do Extra e parei em um faról. Quando ouvi, do carro do lado, um elogio direcionado a mim. Sorri para o lado e, quando percebi, eram dois travestis querendo graça.
- Foram eles que subtraíram o veículo?
- Não, não. Mas sempre gosto de falar das minhas conquistas. Além do que, eu sempre achei que ser paquerado por travestis era sinal de mau agouro. E é mesmo: menos de 20 minutos depois, eu chegava em casa e era rendido por dois elementos de cor indefinida.
- Pardos, você quer dizer?
- Só aceito "pardos" no B.O. se o senhor colocar Silvio como nome do carro.
- Tá. Feito. E depois que os elementos pardos te abordaram?
- Bom, daí eles pegaram o Silvio e deram no pinote. Só me restou vir para cá de carona. Vim na garupa do Silvio.
- Que Sílvio, meu Deus?
- O guardinha da minha rua, que estava dormindo no momento do crime. Ele está ali atrás, ó. Do lado daquela senhora que é a cara do Lazzaroni.
- Ah, estou vendo. É aquele sujeito moreno, de marrom?
- Não seria pardo?
- Seria se eu estivesse escrevendo no B.O., já que na literatura tenho direito a licença poética.
- E B.O. lá é literatura?
- E Silvio lá é nome de carro? E moreno é cor de gente? Não começa a espinafrar que você está perdendo.
- Sei.
- Bom, terminei o B.O. Espera um pouco que eu vou fazer uma intervenção em tinta a duas mãos naquele elemento algemado ali e já volto.
- Vai fazer o que?
- Tirar as digitais. Cada um vê arte no que pode. Agora, senta ali e espera um pouco.
quarta-feira, 12 de agosto de 2009
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3 comentários:
E Silvio? Que pito toca? Foi-se?
como sempre, sensacional...
parabéns
Ah..meus sentimentos pelo Silvio
beijo
Lu
Silvio foi recuperado, pessoal. Traumatizado, mas vivo.
Ele agradece as condolencias. :)
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