quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

O Estranho Caso das Palavras Voadoras e Outros Contos

- Eu sempre fui mau nas aulas de física. 

- Você cortava o cabelo das meninas, grudava chiclete na cadeira do professor ou costumava cagar na lancheira?

- Não. Eu tirava notas baixas mesmo. Por quê?

- Então o correto é mal, com éle. 

- Como você sabe que eu falei mau com u, se eu estou falando?

- Seu sotaque.

- Eu não tenho sotaque.

- Ok, confesso. Eu tenho um super poder. Em vez de ouvir as pessoas, eu vejo as palavras saindo da boca delas. Leio e entendo.

- Você lê os lábios?

- Não. Eu vejo as palavras voando. É um troço muito louco.

- E quando você bebe ou quando sai sem óculos de casa?

- Quando eu bebo muito, aperto os olhos e enxergo. Quando eu saio sem óculo de casa, não tem problema.

- Por quê? São letrões gigantes, à prova de problemas de visão? 

- Não. Porque eu não uso óculos.

- Ah. Mas e se alguém fala pelas suas costas, você não ouve?

- Normalmente, ouço. Ou melhor, leio. Porque a letras aparecem flutuando à minha frente. Como disse, é um troço muito louco. 

- E quando você era criança e analfabeta, como fazia? 

- Primeiro, me fiz de louco. Depois, de surdo. Por fim, mímicas. 

- Deve ter sido difícil para você. 

- Nem tanto. A pior parte é desviar das letras. Quando elas avançam na minha direção, tenho que desviar, para não levar um A ou um C na testa. Dói. Já reparou que sempre que tem alguém falando eu fico me mexendo?

- Já, mas pensei que fosse formiga no cu. 

- Não, é esse problema aí.

- Rapaz... não sabia que pelas leis da física isso era possível. 

- O que só comprova que você é mesmo muito ruim de física.

- Sim. Era isso que ia falar no começo. Que eu sempre fui muito mau nas aulas de física. 

- Mal. Fala direito. Isso fere meus olhos.

- Tá. Mau.

- Mal.

- Ai meu Deus, não consigo. 

- Usa outra palavra. Usa péssimo. 

- Mas não era tão mau assim.

- Tá, mas só pra efeito de desenvolver a conversa.

- Tá. Eu era péçimo em física.

- Argh.

- O quê?

- Você falou péssimo com cedilha.

- Cério?

- Ai meu Deus. Fecha a boca, por favor.

- O que foi agora?

- Sério com c.

- Esse foi de propósito.

- Como assim?

- Era só pra ver se essa história toda era verdadeira.

- E você acha que eu ia inventar algo assim tão estupidamente estranho?

- Nunca se sabo.

- Sabo?

- É. Errei de propósito a grafia.

- Mas trocar e por o não é muito comum. Até se eu tivesse a audição normal, pegaria o erro. Foi um teste?

- Ah, não. É que além de física, sempre fui muito mau em português também. Escrito e falado.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

O Bom e Velho Trote da Telerj

- Fiz um negócio bisonho. Peguei todas as músicas que estão sem nome no meu computador, puxei para o celular e tenho ouvido sem saber o que vai vir. 

- Sei.

- Só hoje, ouvi de Barry White a Jorge Ben, passando por Gil, The Pogues, o Trote da Telerj e uns gemidos de gente transando. 

- "Aqui é Eliseu Drummond".

- "Grandes merda que tu é adevogado".

- Haha. Mas, peraí, você gravou você transando em MP3?

- Rapaz, não transo desde antes de inventarem o toca-fitas. Não sei quem é que tá transando, mas é bem rapidinho. Dura uns 4 segundos. Deve ser coisa de gente com disfunção sexual.

- E não pode ser você?

- Faz tanto tempo que nem lembro. Mas acho que não. Quando eu transava demorava muito mais do que queria. E muito, muito mais do que a pobre diaba queria também. 

- Imagino. Conversar com você já é um sofrimento. Imagino transar.

- Pois é. Falando nisso, tava pensando em um trio musical muito bom. 

- Lá vem.

- Pensei em um power trio com Cassia Eller, Fernanda Keller e Helen Keller.

- Ah, não.

- Sim, sim. Chamaria Keller inGüiça. Que acha?

- Não, não.

- Pô, seria legal. A Cássia Eller seria a percussionista. E a Fernanda Keller, maratonista.

- Pára, por favor.

- E a Hellen Keller poderia ficar com o surdo, manja?

- Não, não, não.

- E o trio poderia ser agenciado pelo Mi Eller.

- Chega, por favor. Tô quase preferindo transar com você.

- Porra, se vai começar com ameaça, então eu paro. 

- Graças a Deus.

- Mas que elas poderiam posar para a revista Ele e Eller, poderiam.

- Olha que eu tiro a camisa.

- Tá, parei. Vou ouvir de novo o Trote da Teller-rj.






terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

O Menino na Gengiva Verde

- Malandro... acabo de tirar um pedaço de couve do tamanho de um ornitorrinco do meu dente.

- Eu acho que não ouvi bem. Pode repetir?

- Acabo de tirar um pedaço de couve do tamanho de um ornitorrinco do meu dente. Tava preso entre meu canino e meu pré-molar.

- Por que você está me falando isso?

- Porque acabei de tirar. Se eu ainda estivesse com a couve presa no dente, dificilmente estaria conseguindo falar. Não percebeu que fiquei a tarde toda em silêncio?

- Você tava com essa couve presa aí desde a hora do almoço?

- Pior que não sei que hora ela entrou na minha boca. Almocei só um pastel. Não comi couve hoje.

- Comeu ontem?

- Também não. Acho que foi no meio da tarde.

- Como assim?

- Acho que eu tava distraído, bocejando no meio da tarde, quando a couve entrou sorrateiramente e se enfurnou entre meu canino e meu pré-molar.

- Couve anda?

- Não sei se anda. Mas que voa, voa. Não tenho outra explicação para ela ter vindo parar aqui.

- A única explicação é que ela entrou voando?

- Isso.

- Já pensou que você pode ter comido couve no final de semana. Aí, uma sementinha dela ficou presa na sua gengiva. Você foi bebendo água e, sem querer, aguando a bichinha. aí, hoje, ela floresceu. Pode ser isso, não?

- Pode. Mas como ela cresceu rápido. Precisaria de adubo, para tanto.

- E as merdas que você fala?

- Opa, opa, opa. Alto lá. Se vai ofender, depois vai ter que aguentar.

- O quê?

- A tréplica.

- Que seria?

- Humm.

- Como?

- Humm. Humm. Humm.

- Ficou mudo?

- Hummm.

- Apareceu outra couve?

- Humm.

- Hahaha. É, e dessa vez nenhuma passou voando. Acho que sua gengiva tá criando couve mesmo. E adubando que é uma beleza.


quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Tem Horas para Dar?

- Tive um problema muito sério vindo para cá hoje.

- Que foi?

- Queria saber as horas, porque esqueci meu celular em casa. E vim com essa dúvida na cabeça até aqui.

- Por que não parou alguém na rua e perguntou?

- Pensei nisso. Mas só cruzei com mulheres e com homens penteados. Aí preferi não arriscar.

- Eu sei que lá vem demência, mas explica isso melhor.

- Eu evito parar mulheres na rua. Elas podem achar que ou vou passar uma cantada ou que vou assaltar. E quero evitar confusão. 

- São mesmo coisas bem semelhantes assaltar ou cantar alguém. Eu mesmo já me confundi várias vezes. Na última, de início, achei que a mina ia levar minha grana. Quando vi, estava atracado com ela num canto qualquer, trocando intimidades. Pior: quando terminamos de nos portar como dois animais, ela bateu minha carteira mesmo, se portando como uma gatuna. E ela estava longe de ser gata, ironicamente. 

- Sério isso?

- Não. É que não entendo como você, parando alguém na rua e perguntando "que horas são?", pode levar a pessoa a achar que é assalto ou paquera.

- Nem eu. Mas já aconteceu comigo. Quase fui parar na delegacia certa feita.

- Como você costuma perguntar as horas? Pára a pessoa, tira do bolso uma meia-calça, coloca na cabeça e diz "passa as horas"? 

- Não.

- Ou pára a pessoa, pergunta "teria horas, coraçãozinho?" e dá uma piscadela sexy?

- Não.

- Então me explica como te confundem.

- Sei lá. Da última vez, a mina achou que eu ia assaltá-la e assediá-la. Tudo porque, percebi mais tarde, eu estava sem camisa, com a braguilha da calça aberta e sem cuecas.

- Você sai assim na rua?

- Só quando eu estou desesperado para saber que horas são. Aí saio de qualquer jeito, como ocorreu nessa última vez. 

- E os relógios da sua casa? 

- O que têm?

- Não estavam funcionando nesse dia?

- Eu estava tão desesperado para saber que horas eram que até esqueci-me deles. Saí correndo à rua como estava, seminu, para descobrir o horário. Mais ou menos como aconteceu hoje. 

- Mas hoje, por sorte, você estava vindo trabalhar. E, portanto, estava vestido e de cuecas.

- Pois é. Mas quis evitar a confusão e não parei nenhuma moça. Vai que eu estivesse sem camisa e sem cueca.

- Você não sabia como estava?

- Quando quero saber que horas são, fico um pouco avoado e distraído, sabe?

- Você falou ali em cima que também cruzou com vários homens pelo caminho. Mesmo assim não quis perguntar?

- Eu não disse homens. Eu disse homens penteados.

- Sei. E não quis perguntar para homens penteados por quê?

- Você confia em homem que se penteia antes de sair de casa? 

- Hummm.

- Nem eu. Preferi vir na ignorância a ser enganado por esses verdadeiros sacripantas. 

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Toqu (is not) inho

- Minha playlist deve ser uma das mais bizarras da humanidade. Hoje vim para cá ouvindo, na sequência, Everything but the girl, Exaltasamba, Toquinho, Scissor Sisters, Andrew Bird, Hot Hot Heat e, quando estava entrando no prédio, começou a tocar Barry White.

- Que coincidência você falar isso. No meu caminho para cá, eu sempre vejo estacionado um Fiesta roxo. E ele sempre está com aquela portinhola de colocar gasolina aberta. Eu sei que o carro não está abandonado, porque na volta ele não está lá. Bom, hoje resolvi tomar uma providência.

- Que foi?

- Bom, resolvi fechar a portinhola.

- E aí?

- E aí, fui pego com a boca na botija. Apareceu o dono do Fiesta e me passou um pito. 

- Como assim?

- Ele saiu de uma forma, a qual fica na frente do carro estacionado e disse "a rá! Te peguei! Então é você que fica roubando meu combustível!".

- E você?

- Bom, esperei ele terminar o arroubo de raiva. Contou que há dias tenta pegar o pilantra. E que hoje tinha conseguido e etc e tal.

- E?

- E aí expliquei que não estava roubando nada. Que só queria fechar a portinhola, porque aquilo irritava meu TOC.

- E ele acreditou? 

- No início, não. Mas aí o argui que, se eu era mesmo o ladrão, onde eu teria escondido a gasolina? Já que eu estava só com uma mochila e mais nada.

- Aí ele acreditou?

- De início, não. Achou que eu podia muito bem ter bebido a gasosa.

- E como você resolveu isso?

- Falei que daria uma baforada na cara dele, para ver se ele sentia algum cheiro de gasolina ou qualquer outro combustível. Mas ele não topou.

- Compreensível.

- Aí ele propôs que eu acendesse um fósforo e engolisse. Se eu não explodisse, ele me liberaria, entendendo que eu era mesmo um bom samaritano e que só queria fechar a portinhola.

- Você topou?

- Topei. Não gostei da ideia no início, mas depois ele falou em "bom samaritano" e me sensibilizou. Sempre quis ser um "bom samaritano". 

- Sei.

- Bom, aí engoli o fósforo. Obviamente não explodi e ele me liberou.

- Você comeu um fósforo aceso? 

- Comi. No começo, dá uma queimação no estômago. Mas depois, nada mais. 

- Ai, ai. E o que isso tem a ver com a história da minha playlist?

- Ah, é que você falou Barry White. E antes deste incidente acontecer, eu estava ouvindo Barry White no MP3 player também. 

- Que coincidência.

- E mais: estava até pensando em montar uma banda cover dele, chamada Barry is not White. Que acha? 

- Acho que você quer ser processado.

- Mas as versões seriam estilo rap ou black music. Assim o nome da banda teria motivo de ser.

- Então acho legal. Você poderia aproveitar e fundar outra banda, chamada Marvin is not Gay e só fazer versões bem másculas dos sons dele.

- Másculas como?

- Sei lá, algo estilo Village People. Ou poderia tentar formar um power trio com a Cher e a Barbra Streisand.

- Isso não faz o menor sentido.

- Outra banda cover legal seria Chico is not da vila Buarque. Ela faria versões só jabaquarenses das músicas.

- O que são versões jabaquarenses? Sei lá. Nem sei onde fica a Vila Buarque.

- Outra boa seria a Ram (is not) Ones, com músicas do Ramones tocadas por uma Big Band de umas 400 pessoas. 

- Seria melhor uma orquestra logo. 

- Mas será que o povo de orquestra consegue tocar só três acordes?

- Não. Aí quem consegue são os Scream ins not Trees.

- Mas esse Tress é de árvore, não de três.

- Ah, nem vem se screamiando que será à trioas.

- Você sabe que isso não faz sentido, né?

- Sei.