- Eu estava vendo um comercial bem idiota que começava com "imagine algo que nunca ninguém imaginou". Daí, passava para "vá lá e faça isso" ou coisa que o valha e terminava com um "e aí, você poderá dizer: eu estive lá".
- Eu já vi. É um da Smirnoff, se não me engano.
- Isso. Ou é de alguma outra bebida vagabunda que quando misturada com Red Bull fica uma gostosura. Toda bebida vagabunda com energético fica boa, já reparou?
- Misturar Kaiser com Red Bull não resulta em gostosura. E olha que Kaiser é uma cerveja bem vagabunda.
- Isso porque você não colocou Red Bull suficiente. 10 latas de energético despejadas sobre meia colher de Kaiser transformam a cerveja em gostosura.
- E também em outra coisa que não é cerveja.
- Mesmo porque Kaiser não é bem cerveja. Tá mais para chorume.
- Churume com muito, muito Red Bull deve ficar bom também.
- O correto é chorume ou churume?
- Na dúvida, usemos o termo "suco de lixo". Que acha?
- Acho propício. Mas voltemos ao comercial que diz "imagine algo que ninguém nunca imaginou". Isso não dá para fazer.
- Como não? Eu acabo de imaginar o Ringo Star com um rabo de peixe no lugar das pernas. Aposto que nunca ninguém imaginou isso.
- Você está me dizendo que ninguém, entre sete bilhões de pessoas, em 59 anos, nunca, nem em um segundo, pensou no Ringo Star transformado em sereio?
- 7 bilhões de pessoas? 69 anos?
- Acho que a Terra tem sete bilhões de habitantes. Esse é o universo de pessoas que poderiam imaginar que estou considerando. Deixo de lado seres extraterrestres e animais, para limitar o espectro imaginativo.
- E os 69 anos?
- 69 anos é a idade do Ringo. Imagino que as chances de alguém tê-lo imaginado com um rabo de peixe antes mesmo dele nascer diminuam muito, embora seja possível que algum Nostradamus da vida tenha imaginado. De qualquer forma, considero um universo limitado a 69 anos e sete bilhões de pessoas para você não reclamar.
- Não reclamo.
- Pois então, você me garante mesmo que nunca ninguém imaginou o Ringo Star com um rabo de peixe? Que nem por um segundo um morador do Himalaia imaginou o Ringo sereio antes de dormir? Ou que um esquimó, em uma alucinação resultante da aspiração em excesso de fumaça de óleo de foca queimado, pensou na cena?
- Não garanto, claro. As possibilidades são muitas. Mesmo porque rabo de peixe e Ringo Star são coisas até que populares.
- Menos do que barbatana de tubarão ou do que o John Lennon, mas, mesmo assim, populares. Viu como é duro imaginar algo que nunca ninguém imaginou?
- Acabo de imaginar você com uma segunda cabeça saindo do seu pescoço. E essa segunda cabeça é a do Chico. Na cabeça do Chico, há um papagaio pousado. O papagaio, chamado Sheila, fala sem parar "José Serra para presidente". Isso é inédito, não?
- Quem é Chico?
- Um amigo do meu pai do tempo em que eu era pequeno. Ele tinha um papagaio de verdade. Chamava Sheila. Só não sei se o papagaio gostava do José Serra a ponto de defendê-lo para a presidência da república. De toda forma, isso me parece inédito.
- Você me garante isso?
- Quem mais imaginaria essa bobagem?
- Existe mais alguém que me conhece, que conhece o Chico e que conhece o papagaio dele além de você?
- Ixéste. Meu pai, minha mãe, minhas irmãs. Acho que uns dois tios meus e uns primos aí. Mas acho que eles não são bobos a ponto de imaginarem você com duas cabeças, um papagaio e o Pedro Simon para presidente.
- Você me garante isso? Garante que um desses seus tios nunca encheu o caneco e em suas ilusões etílicas imaginou minha cabeça, a do Chico e a Sheila sobre o mesmo pescoço?
- Difícil garantir isso. Mas meus tios não bebem, logo, seria muito complicado eles pensarem isso bêbados.
- Não muda de assunto. Você jura por sua mãe e por tudo o que é mais sagrado que eles nunca imaginaram isso?
- Tá. Não juro.
- Viu!?
- Quando eu tinha uns 12 anos, escrevi uma história de terror. A personagem principal era a Samantha Taylor. Ela era meio amaldiçoada. Nunca mostrei essa história para ninguém. Quando eu tinha sete anos, possuía um relógio amarelo, quadrado e digital, muito invocado. Neste momento, imagino a Samantha Taylor equilibrando esse relógio na testa. No ombro dela, a Sheila pede José Serra para presidente. Pronto, taí algo que nunca ninguém imaginou porque nunca ninguém leu a história e ninguém sabe como é a Samantha Taylor.
- Ela era loira, baixinha, com um olhar penetrante?
- Não. Era a Luiza Brunet, mas com uma pinta no rosto, tipo a Marilyn Monroe. Eu dei a ela o nome de Samantha Taylor só porque as duas primeiras sílabas formavam a palavra "Satã".
- Satã?
- Já mencionei que era um conto de terror?
- Ah, sim. E, falando nisso, já reparou que hoje é dia 9/9/9? É o contrário de 6/6/6.
- Rapaz! É o dia do Capeta Plantando Bananeira. Ou do Capeta Bizarro, que no fim das contas é Deus.
- De volta à Samantha Taylor, acabo de imaginar a cena. Vi na minha frente a Luiza Brunet pintada com um relógio amarelo e quadrado na testa. Viu como é difícil imaginar algo que nunca ninguém imaginou? Você imaginou, mas eu também. Chupa!
- Eu imaginei a cena 5 segundos antes de você. Até eu tê-la imaginado, ninguém mais no mundo havia pensado nisso. Pronto, provei que é possível imaginar algo que nunca mais ninguém imaginou.
- Tá. Provou seu ponto. Mas mesmo assim, o comercial não pára em pé porque diz algo como "vá lá e faça acontecer". Depois de você imaginar algo que nunca ninguém imaginou, como vai fazer isso existir? Vai pegar a Luiza Brunet, pintar a cara e colocar um relógio na testa dela, para fazê-la equilibrar?
- Isso eu acho até possível. O complicado mesmo vai ser convencer um papagaio a defender o Serra para presidente.
- É, pensando bem, não dá. Tudo tem limite.
- Te falei.
2 comentários:
Muito bom esse blog, acompanho há alguns meses já, parabéns.
Esse texto ficou demais, mas só prá corrigir: O Ringo tem 69, e não 59.
Valeu, Rodrigo.
Tanto pelos elogios quanto pela informação. Já vou corrigir.
Abraço
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