- Como é que foi esse negócio da mendiga mesmo?
- É uma história meio longa. Quer ouvir mesmo?
- Conta aí. Já deu seis horas, é meu rodízio, não posso ir embora e não tô fazendo nada mesmo.
-Então, esse meu amigo tem uma banda. Aí eles resolveram gravar um clipe. Precisavam de uma garota bonitinha, mas não muito, para encener o clipe.
- Como é que funciona isso?
- Isso o que?
- Bonitinha mas não muito. Se aparecesse uma bem bonita, muito linda mesmo, tipo a Amélia Vega, eles não aceitariam?
- Parece que não. Queriam alguém com uma beleza comum. Bonita, pero non troppo, manja? Não podia ser gostosona também. Juliana Paes, por exemplo, estaria vetada.
- Quem não estaria? A Catifunda valia?
- Não avacalha.
- Não, não, só quero entender. E eu nutro sentimentos pela Catifunda. Ela parecia minha professora de química do colégio.
- E você era apaixonado pela velha?
- Não, não. Mas eu gostava muito do nome dela: Joana Fume Carlton. Bonito, né?
- Meio politicamente incorreto.
- Passei a admirá-la quando fiquei sabendo o nome completo.
- Tá, mas como funciona esse negócio de beleza normal?
- Então, não poderia ser uma Juliana Paes, uma Amélia Vega ou uma Catifunda. Teria que ser alguém de uma linhagem do tipo a Fernanda Rodrigues ou a Maísa, do SBT, daqui uns anos. Nem feia, nem bonita, nem gorda, nem magra, meio cansada, mas não muito.
- A Maísa vai ser assim? Acho que ela tá mais para a Susan Boyle.
- Tudo indica que ela vai ter uma beleza normal, nem lá, nem cá.
- Tudo o que?
- Os astros.
- Que astros, meu Deus?
- Quer ouvir a história ou não?
- Conta, pô.
- Então, aí eles descolaram uma atriz que topou fazer o clipe de graça, ou quase de graça. Ela era do jeito que eles queriam e ela tinha uma beleza bem comum.
- Correto.
- Aí a única coisa que eles tinham que fazer era pagar a passagem e a estadia. Além dos traslados, como aeroporto e tudo mais.
- É um preço baixo a se pagar por alguém com uma beleza tão enigmática, eu diria.
- Imagina a Fernanda Rodrigues e pára de azucrinar.
- Esse acento no parar caiu com a nova regra.
- Só em 2012.
- Bom, então não se preocupa. Em 2012, o mundo acaba. Até minha avó sabe disso.
- Deus do Céu, quanto palpite.
- É que não tenho nada para fazer. E tenho que enrolar até às 20 horas, por causa do rodízio.
- Mas eu, não. Posso terminar?
- Fique à vontade.
- Pois então, daí acharam essa atriz. Ela viria do Rio. E alguém teria de buscá-la no aeroporto. Mas como foi o pessoal da banda que bancou a passagem, ela chegaria de madrugada, já que é o horário dos vôos mais baratos. Viria de sexta para sábado.
- Ela parece mesmo a Fernanda Rodrigues?
- Não sei, não a vi. O fato é que aí esse meu amigo ficou responsável por buscá-la no aeroporto. Só que como ela chegava de madrugada, justamente em um final de semana, ele resolveu beber umas coisas, enquanto esperava dar a hora de ir buscá-la. Daí bebeu, bebeu, bebeu.
- E perdeu a hora?
- Pelo contrário.
- Achou a hora?
- Chegou meio bêbado no aeroporto e quando viu a garota, desencanou de beleza normal. Para os olhos dele, era uma deusa. E mais: uma deusa dando mole. Tentou agarrar e o diabo. Cada vez que saía um som do alto-falante anunciando vôo, ele entendia que era alguma música de micareta.
- E a atriz?
- Horrorizada, pegou o primeiro avião de volta para o Rio.
- E ele?
- Ainda tentou graça com umas três ou quatro garotas no aeroporto e se deu mal. Daí não entrou em pânico, porque não deu tempo de ficar sóbrio. Ainda bêbado, saiu do aeroporto direto para a Augusta. Foi procurar alguma prostituta com uma beleza normal que pudesse estrelar o clipe sem cobrar muito.
- E conseguiu?
- Nada. Acabou de descolou uma mendiga mesmo. Debaixo da sujeira, ele não sabia se ela tinha uma beleza normal ou não. Meteu ela embaixo de um chuveiro e rapidamente foi para o lugar do clipe, que ia ser gravado às 5 da manhã. Chegou com a moça lá, ainda meio bêbado, todo pimpão.
- E essa mendiga encenou o clipe? O pessoal da banda não achou estranho ele aparecer com outra moça que não era aquela com quem eles haviam combinado?
- Sim, acharam. Mas não tinha muito o que fazer. Ou usavam a mendiga ou colocavam uma peruca loira nesse meu amigo e filmavam ele como garota no clipe.
- Deixa ver se eu entendi: eles aceitaram uma mendiga, mas não aceitariam a Juliana Paes. É isso?
- Pelas circunstâncias, tiveram que aceitar.
- E o clipe ficou bom?
- Então, a gravação seria feita em dois dias. Só que no segundo dia, a equipe atrasou para chegar. Aí a tal mendiga deu um chilique, falou que não estava sendo respeitada e o diabo e se recusou a encenar. E não teve Cristo que fizesse a mulher filmar. No auge da discussão, ela pegou seu saco de tralha e foi embora. Se mandou sem olhar para trás e sempre resmungando.
- Caceta! E o clipe, como ficou?
- Desistiram. Resolveram filmar eles tocando em um show e botar no YouTube. Acharam mais fácil.
- Que final de história mais triste.
- Se para você é triste, você não imagina para o meu amigo.
- Por que?
- Antes de decidirem pelo clipe do show, deram uma peruca loira para ele e o fizeram encenar umas partes do clipe, para ver se ficava bacana.
- E não ficou?
- Nada. Parece que ele era um travesti muito feio.
- E eles queriam um travesti com uma beleza comum, nem lá nem cá. Tipo a Fernanrda Rodrigues de bigode. Confere?
- Exatamente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário