terça-feira, 2 de março de 2010

Ajudante de Ambulante

- Preciso fazer alguma coisa para me animar.

- Como?

- É que eu estava analisando minha vida.

- Lá vem...

- É sério. E reparei que sempre que vou em algum lugar, acabo de envolvendo com as pessoas mais escumalhentas do local.

- Regras da atração, sabe? Porcaria atrai porcaria.

- Sei, sei. Mas a coisa já passou do limite.

- Como assim?

- De uns tempos para cá, nem mesmo essas meninas que ficam na porta da lojas oferecendo crediário, empréstimos, cursos de inglês e de informática me chamam. Já estou um nível abaixo desse povo aí.

- Você queria fazer crediário? Tá precisando de grana ou coisa assim?

- Não. Mas percebo que, pelos olhos dessas moças, estou num grau de vida sub-necessitado. Aquele necessitado que não pode nem pagar por essas coisas.

- Ou um nível acima. Do bem sucedido. Se bem que, olhando para você, ninguém diz.

- Exatamente. E repare: sempre que estou na rua, na padaria, ou onde quer que seja, quem vem conversar comigo?

- Não são as mocinhas do crediário.

- Não são. Não mendigos, pedintes, pungistas e lelés da cuca em geral.

- E isso te incomoda.

- Não muito. Mas andaei reparando que é frequente. Se vou a casamentos, já me junto logo à turminha do funil e sou o último a ir embora. Se vou a batizados, quase não me deixam entrar na igreja, mesmo que eu seja o padrinho. Aliás, muitos amigos meus me chamaram para ser padrinhos de casamento deles porque disseram que seria a única chance de me verem bem vestido na cerimônia.

- Hahahaaha.

- Nesse carnaval, por exemplo. Fui muito humilhado.

- Você me contou. Te tiraram de traficante e outras coisas, não?

- Sim. Mas agora, remexendo na minha mente, vi que além de tudo, me prestei a um papel de ambulante.

- Como assim?

- Lembrei que no meio de um bloco, me envolvi com um vendedor de "tequila" e acabei vendendo a bebida dele para terceiros, sem qualquer pudor.

- Por que tem essas aspas na palavra tequila?

- Porque desconfio que não era tequila. Parecia conhaque com água. Mas como tava quente, já que eu estava vendendo a um sol de 40 graus, podia ser qualquer outra coisa, como metanol. Mas tequila não era.

- Você vendeu ou bebeu?

- Vendi e bebi. Comecei bebendo. Daí, resolvi vender. E ganhava comissão: a cada 3 doses vendidas, podia beber uma. Foi uma maravilha.

- E o dono da garrafa?

- Ele só ficava com a grana. Eu vendia, servia, oferecia, negociava. O rapaz só ficava com a grana.

- Cara, então acho que realmente você atingiu um nível inferior na escala profissional. Ajudante de vendedor de falsa tequila é demais, hein.

- É. Mas foi pior.

-Por que?

- Já te falei que eu estava vestido de Minnie?

- A rata?

- É. Olha as fotos.




6 comentários:

Anônimo disse...

Você mora na rua?
Eu queria tanto conversar.

Unknown disse...

Caralho. Essa foi épica. Já "trabalhei" como ajudante de vendedor de cerveja voluntário na saída do show do AC/DC. Mas, fazer isso no Cordão do Bola Preta transcende qualquer coisa. Estou emocionado.

Anônimo disse...

Ypióca.
Quer enganar q tá vendendo tequila? Na próxima vende Ypioca.
Funciona.
Garanto.

Tércio Silveira disse...

Espetacular. Como vc atrai mendigos, aposto que a Érika Mader não me deu bola por causa da sua presença ao meu lado. rs.

Buchabick disse...

Juliano, quando eu disse "vida indigna", eu não estava usando metáforas.

Tércio, eu tinha apagado completamente esse episodio da Erika Mader da minha cabeça.

Anônimo disse...

Já fui ajudante de vendedor de cerveja na saída do estádio na final do
brasileiro de 1998: "corinthians x cruzeiro", quando fomos campeões... Lembra disso, Bucha? Vc estava comigo lá e bebeu algumas latinhas, que era a nossa comissão. hahahahaha, deve ser de família o tino comercial e a falta de vergonha.

Primo