- Se motoristas de ambulância ganhassem comissão por produtividade, certeza que eles iam atropelar pessoas de propósito só para poderem enfiar na caçamba e tirar uns trocos a mais.
- Sei não. É o mesmo que dizer que se açougueiro ganhasse comissão por fazer carne moída, eles iriam fatiar as pessoas a torto e a direito, só para ganhar mais um pouco.
- Sabe que eu estava pensando isso hoje de manhã. Até apressei o passo quando estava perto de um açougue, só por medo de ser picado.
- Hoje de manhã, não consegui pensar em nada. Entrei no banco distraidamente e tomei um susto enorme. Foi tão grande que, de tão atônito, levei umas duas horas para me recobrar.
- Foi assaltado?
- Nada. Entrei na fila do caixa automático e tals. Quando reparei nas pessoas ao redor, vi que na minha frente estava uma mulher que tinha o corpo mais disforme que já vi em uma pessoa sem que ela fosse oficialmente deformada.
- Era gorda demais? Ou magra demais?
- Difícil definir em linguagem humana. Mas vou tentar te dar uma idéia clara. Imagina um vaso.
- De quê?
- Barro. Com um pouco de argila.
- Certo.
- Pinta com tinta guache vermelha.
- Ela era índia?
- Certeza que não. Se fosse, os índios teriam sacrificado em homenagem ao deus sol ou sem motivo religioso bem demarcado. Em resumo: a sacrificariam só para livrar a aldeia daquela feiura.
- Entendo.
- Agora, pinta com um pouco de amarelo por cima.
- Ainda com o guache?
- Não. Pode ser com gema de ovo cru.
- Tá ficando feio.
- Agora cola umas penas no vaso. Pega uma cabeça de gente, pode ser uma bem parecida com a do Abraham Lincoln, e coloca dentro do vaso.
- Éca.
- Agora, jogue água até a borda. Se a cabeça boiar, pronto. Temos uma imagem aproximada do que vi hoje.
- E se a cabeça não boiar?
- Aí todo meu esforço de descrição foi em vão. A imagem fica bem distante da mulher do banco. Uma pena.
- Mas eu acho que cabeça bóia.
- Pode imaginar isso?
- Acho que posso, peraí.
- ...
- CREDO! Que disformidade.
- Viu. E isso porque só falei de uma parte do corpo dela. Quer que descreva a parte de riba?
- Ué, e essa cabeça boiando no vaso?
- É só até a cintura. Continuo?
- Hummm. Não sei se quero.
- Bom, acho que se eu continuar, quando chegar nos ombros, você já estará cego. Daí pra cima, é perda de lucidez na certa.
- Então deixa quieto.
- E para piorar, ela ainda demorou na máquina. Parece que não sabia bem como operar. Os outros dois caixas estavam quebrados e eu não tve alternativa a não ser esperar.
- Hummm.
- Quando ela finalmente saiu, eu estava ainda em estado de choque. Esqueci minha senha, o que ia fazer no caixa e tudo mais.
- Perdeu seu tempo, então. E o pior: sofrendo.
- Fato. Acho que nesses 10 minutos na fila, perdi coisa de umas semanas de vida. Seria mais saudável se eu tivesse fumado um cigarro.
Um comentário:
huahuahauahua
Cara, sensacional!
Deu vontade de fumar....
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