quarta-feira, 4 de maio de 2011

Banhos Públicos em Lugares Nada Privados

- Por que você tá de capacete?

- Ah, ganhei de uma mendiga. Peraí que vou tirar.

- O quê?

- Ganhei de uma mendiga. Peraí que vou tirar?

- Tira o capacete, que não entendo nada do que você tá falando.

- Peraí, vou tirar.

- O quê?

- Pronto. 

- Argh. Sua cara tá preta.

- Sério? Acabei de tomar banho.

- É. Parece carvão. 

- Preciso ver no espelho.

- Pega esse. Olha.

- De onde você tirou esse espelho tão rápido?

- Não importa. Olha.

- Eita!

- Viu?

- Hummm. Já sei. Deve ter sido a mendiga que me deu esse capacete. A gente acabou de tomar banho junto. 

- Eu vou só recapitular, para ver se entendi e se não perdi minha sanidade. Você tomou um banho com uma mendiga, banho esse que te deixou mais sujo, e ela te deu um capacete, para você vir trabalhar?

- Do jeito que você coloca, parece maluquice. 

- Existe um jeito de isso não parecer maluquice?

- Olha, eu estava vindo para cá. Sempre passo em uma praça que foi tomada por uns sem-tetos. Quando passo por lá, até afrouxo o passo, porque gosto de me misturar, sabe?

- Sei.

- Bom, aí num dos cantos dessa praça, que dá de frente para a Via Anchieta, tinha uma mulher se banhando, mas tipo aqueles banhos de gato. Ela pegava uma esponja e passava no rosto e coisa assim. Com o sol matutino batendo nela, que estava com um belo vestido esfarrapado e amarelo, e os carros passando em alta velocidade ao fundo, me emocionei. 

- E fez o quê? Puxou um papel de pão e escreveu uma poesia?

- Quase. Eu sorri. 

- E aí?

- E aí que ela sorriu de volta. E acabou de convidando para seu banho.

- E você aceitou?

- Tenho uma política: nunca recusar tomar banho com uma mulher. Nunca neguei esse tipo de convite.

- Já te aconteceu muito?

- Primeira vez. Mas não quis perder a chance.

- Tá, e aí você se banhou?

- Sim, estilo banho de gato. Ela pegou uma esponja e passou no meu rosto. Depois, fumamos um cigarro. Ela perguntou se tinha sido bom para mim, eu disse que sim e pronto, vim embora.

- E o capacete?

- Ah. Então, quando eu estava saindo, ela me chamou de volta.

- Para?

- Disse que meu cabelo tava todo zuado, por causa do banho. Perguntou se queria que ela secasse ou penteasse.

- E ela não fez uma coisa nem outra?

- Mais ou menos. Pedi para ela fazer tudo o que eu tinha direito: secar e pentear. Aí ela começou a baforar uns restos de fumaça de Hollywood vermelho no meu cabelo. 

- Tá. 

- Aí quando terminou, disse que infelizmente tava sem pente. Mas tinha um negócio que me deixaria mais bonito. E me deu esse capacete. Legal, né?

- Lindo. Mas olha, ela só sujou sua cara. Se fosse você, iria ali no banheiro e dava uma esfregada.

- Vou manter. Já já volto para casa e vai que no caminho a encontro de novo. 

- Você acha que ela ia se ofender se te visse limpo?

- Pelo contrário. Mas se eu me limpar, vai que perco a oportunidade de tomar outro banho com ela.

Um comentário:

Rogéria disse...

excelente